Alexandre pede vista em julgamento sobre voto de qualidade no Carf

O julgamento sobre o voto de qualidade no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) mal foi retomado no Supremo Tribunal Federal e já foi suspenso de novo, dessa vez por pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes.

A votação em Plenário Virtual, que abriu e foi suspensa nesta sexta-feira (18/6), contava com os votos do relator, o ministro Marco Aurélio, e com a divergência aberta por Luís Roberto Barroso, em voto-vista.

Marco Aurélio defendeu a inconstitucionalidade da mudança legislativa que acabou com o voto de qualidade no Carf. Para o decano do STF, a lei padece de abuso do poder de emenda, pela prática do "contrabando legislativo", popularmente conhecido como jabuti: a prática de incluir, durante a fase de conversão da medida provisória em lei, dispositivos tratando de tema sem relação com a proposição original.

Já o ministro Barroso divergiu, considerando a nova norma constitucional. Ele propôs a seguinte tese: "É constitucional a extinção do voto de qualidade do Presidente das turmas julgadoras do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), significando o empate decisão favorável ao contribuinte. Nessa hipótese, todavia, poderá a Fazenda Pública ajuizar ação visando a restabelecer o lançamento tributário".

Minerva tributária

A  Lei 13.988/20 alterou o regime do voto de qualidade no Conselho. Ao dar nova redação ao artigo 19-E da Lei 10.522/2002, a manifestação de desempate a favor do Fisco feita pelo presidente da turma julgadora passou a não mais ser admitida em "julgamento do processo administrativo de determinação e exigência do crédito tributário". Assim, as controvérsias deveriam passar a ser resolvidas favoravelmente ao contribuinte.

Antes da alteração legislativa, os casos empatados no Conselho eram decididos pelo voto de qualidade, por meio do qual o presidente da turma de julgamento, sempre representante da Receita Federal, proferia o voto de minerva.

Vício formal

A Lei 13.988/20 originou-se da Medida Provisória 899/2019, editada pelo presidente Jair Bolsonaro com o objetivo de suprir a ausência de regulamentação, no âmbito federal, do disposto no artigo 171 do Código Tributário Nacional. Trata-se da norma que permite transação tributária e extinção de créditos.

A minuta inicial apontava que a falta de regulamentação impedia maior efetividade da recuperação dos créditos inscritos em dívida ativa da União e gerava excessiva litigiosidade, aumento de custos, perda de eficiência e prejuízos à administração tributária federal.

Durante a sua conversão em lei, o Congresso incluiu e aprovou o trecho que trata do voto de qualidade, apesar de não constar do texto originário. 

"Considerada a celeridade do processo legislativo da medida provisória, acabam limitados a participação da sociedade civil e o debate público, inclusive no âmbito das comissões temáticas do Parlamento, próprios do rito ordinário de deliberação legislativa. Há inobservância do princípio do devido processo legislativo", destacou o ministro Marco Aurélio.

Barroso, no entanto, discordou, ao enxergar "dúvida razoável" quanto à pertinência temática entre a MP e a emenda parlamentar. "A caracterização do que sejam acréscimos impertinentes ainda se encontra em construção, fora das zonas de certeza positiva e negativa."

"No caso presente, todavia, considero ainda mais relevantes as dúvidas quanto à constitucionalidade da admissão ampla do voto de qualidade nos julgamentos do CARF", argumentou. "Nesse contexto, declarar a inconstitucionalidade formal do dispositivo questionado nesta ação implicaria fazer repristinar uma norma de duvidosa constitucionalidade material. Não me parece que seja essa a melhor solução."

Vício material

Reconhecida a inconstitucionalidade formal, Marco Aurélio ainda analisou e afastou a existência de vício material. Apontou que o artigo 19-E inserido na Lei 10.522/2002 não criou voto de qualidade em benefício do contribuinte; apenas definiu que, se não há maioria no colegiado do Carf, não se tem confirmado o lançamento do tributo. 

"A adoção, no contencioso fiscal, de solução favorável ao contribuinte, em caso de empate na votação, não conflita com a Constituição de 1988. É opção legítima e razoável do legislador, estando em harmonia com o sistema de direitos e garantias fundamentais", afirmou.

Nesse quesito, Barroso concordou com o relator. "Aparentemente, o voto de qualidade desequilibrava a relação entre o Fisco e o contribuinte no processo administrativo tributário. O legislador optou, então, por mudar essa sistemática, proibindo a sua adoção nos julgamentos relativos à determinação e à exigência do crédito tributário", explicou.

Para ele, a opção feita pelo legislador é compatível com a Constituição. "Não há, no texto constitucional, a imposição de que os  impasses nos julgamentos do Carf — ou de órgãos de contencioso administrativo em geral — sejam solucionados por um método específico."

"O constituinte deixa a cargo do legislador escolher entre variadas formas de desempatar uma disputa, exigindo apenas que tal método esteja em consonância com a ordem constitucional, notadamente com o princípio da isonomia entre Fisco e contribuinte e com o devido processo legal."

As ADIs

São três ADIs julgadas em conjunto: uma delas foi apresentada pela Procuradoria-Geral da República e defende que a lei que acabou com o voto de qualidade no Carf padece de inconstitucionalidade formal, por vício no processo legislativo. O dispositivo que alterou a lei foi incluído em uma Medida Provisória que regulamentava transações tributárias no país.

A outra, protocolada pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB), alega que a medida desequilibra a paridade dos julgamentos no conselho, pois privilegia o polo privado do conselho, fere a soberania do Estado e acaba com a paridade de armas na discussão sobre uniformização jurisprudencial e controle de legalidade dos atos praticados pela autoridade fiscal.

A última delas partiu da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Anfip) e sustenta que o fim do voto de qualidade vai acarretar perda imensurável de arrecadação para os cofres públicos. A medida implicaria, inclusive, em possível carência de recursos para o combate da epidemia do coronavírus.

Conjur

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