A 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), ao julgar mais um caso de pejotização, passou a cogitar a possibilidade de que, caso seja admitido o vínculo empregatício de funcionários que eram contratados via PJ, que seja determinado que esses funcionários recolham todos os encargos tributários e previdenciários do que receberam, como funcionários celetistas. Para os ministros, isso inibiria que pessoas que concordaram em serem pejotizadas e pagaram menos tributos entrassem na Justiça do Trabalho pedindo vínculo empregatício.
A questão foi levantada pelo ministro Alexandre de Moraes na sessão de terça-feira (22/10). Ele afirmou que, num primeiro momento, as pessoas concordam em serem contratadas por pessoas jurídicas, e depois do término do contrato, entram com ação judicial. “Aquele que aceitou, assinou o contrato, depois entrou com ação, deveria pagar todos os tributos de pessoa sica. É algo que não bate no final. Ele entra na Justiça, acaba ganhando a reclamação, mas depois tinha pagado todos os tributos como pessoa jurídica”, diz.
O ministro Flávio Dino concordou nesse ponto, apesar de ter voto divergente no caso que estava sendo discutido, e pediu a retificação do seu voto para constar que nesses casos em que há o reconhecimento do vínculo deve haver o pagamento dos tributos de pessoa física. Luiz Fux também afirmou que a Justiça do Trabalho deveria dar esse recado. “Se houver essa artimanha, vão ter casos em que se vai pagar muito mais do que vai receber”, diz. Cármen Lúcia também afirmou que este ponto é um avanço importante que ela deve passar a considerar. O ministro Cristiano Zanin foi o único que não se manifestou a respeito.
O caso
A questão foi levantada quando a 1ª Turma do STF julgava mais um caso de reclamação contra reconhecimento de vínculo na Justiça do Trabalho. No caso, a reclamação foi ajuizada pela Lynxfilm Produções Áudio Visuais contra decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (TRT-1), com sede no Rio de Janeiro, que tinha reconhecido vínculo de emprego com um prestador de serviços. Por enquanto, o julgamento tem um voto contra a reclamação (Flávio Dino) e dois a favor (Alexandre de Moraes e Cármen Lucia).
O TRT entendeu que seria um caso de fraude à legislação trabalhista, nas quais estariam presentes os requisitos previstos nos artigos 2o e 3o da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que caracterizam o vínculo empregatício.
O processo tinha ido ao plenário virtual, mas após decisão do relator, ministro Flávio Dino, que negava provimento à reclamação trabalhista, por entender que não existe aderência aos temas julgados no STF sobre terceirização e que não poderia rever provas, o ministro Alexandre de Moraes então pediu destaque para levar o caso a julgamento presencial.
Na terça-feira (22/10), na sessão da 1ª Turma, o ministro Alexandre de Moraes afirmou que julgava procedente a reclamação por entender que existe aderência ao caso ao que foi julgado na ADPF 324, que tratou da licitude da terceirização. Para ele, trata de um contrato de prestação de serviços firmado com a Lynxfilm e um prestador de serviços na área de teledramaturgia e de assistente de iluminação por obra. Porém, essa empresa terceirizou o serviço para a Record.
Segundo Flávio Dino, contudo, não daria para dizer que é a mesma situação discutida na ADPF 324 que somente tratou de quem seria a responsabilidade pelos encargos trabalhistas, se pela tomadora ou prestadora de serviços, e que não tratou da discussão da pejotização. Para ele, a discussão sobre vínculo empregatício só ocorreu no plenário para motoristas autônomos, salão de beleza e terceirizados. “O que está acontecendo é que no mundo dos fatos isso está sendo alargado. Uma pessoa está vendendo sapatos e no dia seguinte passa a ser pessoa jurídica. Isso não é terceirização, são coisas diferentes. Isso que está acontecendo não é apenas fraude contra os direitos trabalhistas, mas uma fraude contra o erário”, diz.
Para Dino, o caso em discussão só trataria do mesmo caso já julgado de terceirização se o prestador pedisse vínculo com a Record. Para ele, esse pejotizado vai envelhecer e não terá aposentadoria, vai sofrer acidente de trabalho e não terá afastamento previdenciário, se for mulher vai engravidar e não terá licença maternidade.
Luiz Fux destacou que quando o plenário do Supremo julgou a terceirização, falavam que as grandes empresas, como as de call center, por exemplo, não teriam como manter 60 mil funcionários e, que por isso, a terceirização seria uma nova forma de fomentar o mercado de trabalho. “A terceirização atividade, fim foi justamente para não criar vínculo empregatício na terceirização”, diz. Para ele, há pelotizações e pelotizações e a Justiça do Trabalho tem que comprovar vínculo empregatício e, nesse caso, determinar que sejam pagos todos os tributos devidos. Para Fux, “só isso vai dissuadir essas aventuras”. “Concordo que ele [pejotizado] vai ficar sem aposentadoria, sem benefício previdenciário. Mas ele pagou para isso? Nós não pagamos?”, disse.
Carmen Lúcia então votou para dar provimento ao agravo da reclamação e determinar que o TRT dê uma nova decisão, de acordo com os julgamentos do Supremo.
Em seguida, porém, Cristiano Zanin destacou que ao analisar o caso, viu que a decisão que tratou do vínculo já tinha transitado em julgado (não cabia mais recurso) no TRT e que no TST havia apenas um recurso pendente que apenas discutia representação sindical. E por isso, não poderia aceitar a reclamação. Diante disso, Dino pediu vista novamente para analisar essa questão.